A NR01 e a performance organizacional.
18.04.2025
Enfim uma norma governamental que trata da saúde psicossocial dentro das organizações.
Uma pena que essa iniciativa tenha vindo do governo de forma impositiva, como norma a ser “obrigatoriamente” seguida, quando deveria ser parte do modelo de gestão que busca realizações sempre melhores. Digo isso porque desde 1979, quando iniciei minha carreira como estagiário de psicologia em uma grande empresa multinacional, já tínhamos um grupo multifuncional (engenheiros e técnicos de segurança, psicólogos (as), médicos, enfermeiros (as) e assistente social) que perseguia a implantação de procedimentos em busca dos objetivos agora definido de forma impositiva na norma NR1 que hora surge no senário organizacional. Naquela época já tínhamos a convicção de que qualquer organização que desejasse alcançar patamares elevados de realizações só poderia fazê-lo com pessoas saudáveis, capazes de praticar suas atividades por longo tempo, cumprindo processos cientificamente definido e sem desperdício.
A meu ver, o principal valor dessa norma para uma organização que pretenda se perenizar na sociedade, é a incorporação de procedimentos prevencionistas de saúde psicossocial, garantindo um estado de vida saudável, capaz de conseguir alta performance, como elemento integrante do modelo gerencial e operacional. Principalmente quando incentiva a busca e utilização de processos com alta segurança comportamental baseados em conhecimentos claramente fundamentados na ciência.
Tomo a liberdade de copiar aqui alguns trechos do guia, “NR01 – Guia Fatores de Riscos Psicossociais-TEM”, recém-publicado, como argumentos comprovadores do que estou demonstrando aqui.
“Nessa publicação estimou-se que no mundo 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos anualmente devido à depressão e à ansiedade, o que representa um custo de quase um trilhão de dólares à economia global, relacionado, de forma predominante, à perda de produtividade (WHO; ILO, 2022)”. Pag. 04.
“Fatores de risco psicossociais estão relacionados diretamente com a organização do trabalho. Eles decorrem de problemas na concepção, na organização e na gestão do trabalho, podendo gerar vários efeitos à saúde do trabalhador em nível psicológico, físico e social…”. Pag. 05,
“Planejar, implementar as ações, fazer a verificação dessas ações e depois corrigir o que for necessário, num processo contínuo de melhoria das condições de trabalho, incluindo os fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho (ISO 45003:2021)”. Pag. 06.
“É importante perceber que, na avaliação dos fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho, trata-se de considerar quais os fatores da atividade de trabalho são estressores… Não se trata de verificar sintomas individuais ou sensação do que está ocorrendo no trabalhador, ou de medir algum sinal biológico, por exemplo, mas de se verificar as condições de trabalho a que ele está submetido”. Pag. 06.
“De acordo com a NR-17, a gestão de ergonomia é obrigatória para todas as organizações e situações de trabalho, com o objetivo de adaptar as condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar conforto, segurança, saúde e desempenho eficiente no trabalho (itens 17.1.1 e 17.2.1 da NR-17)”. Pag.07.
“Portanto, mesmo que a empresa não tenha PGR, de acordo com a previsão da NR-1, ela está obrigada a fazer a AEP (Avaliação ergonômica preliminar), incluindo os fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho”. Pag. 07.
“Listagem exemplificativa de fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho que podem acarretar agravos à saúde do trabalhador”: Pag. 07.
Separei alguns itens que me chamam a atenção nessa tabela porque demonstram a preocupação dessa norma com a saúde e performance como fatores interdependentes… Muito conectados com o modelo de “gestão” que tenho utilizado em minha metodologia de assessoria em busca de organizações de alta performance. Os parênteses após as aspas são os procedimentos que utilizo.
“Má gestão de mudanças organizacionais” |
“Baixa clareza de papel/função” (Expectativa de performance) |
“Baixas recompensas e reconhecimento” (Feedbacks e reconhecimentos diferenciados) |
“Falta de suporte/apoio no trabalho” (Acompanhamento contínuo) |
“Baixo controle no trabalho/Falta de autonomia” (indicadores de performance úteis) |
“Eventos violentos ou traumáticos” |
“Baixa demanda no trabalho (subcarga) “ |
“Algumas orientações de como proceder para a realização da identificação de perigos, da avaliação de riscos e da implementação de medidas de prevenção referente aos fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho”. Pag. 08.
“Busca por profissionais especializados, sempre que possível, deve se basear também na escuta ativa da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio – CIPA, caso exista, e das representações dos trabalhadores (item 5.3.1 da NR-5)”.
“Envolver os profissionais de SST (especialmente o Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho – SESMT, se houver), os níveis gerenciais, a alta administração, o líder de equipe, o supervisor de área, e assim por diante, além de todos os trabalhadores. Todos serão importantes nesse processo”.
“Se a identificação e avaliação de fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho nunca foi feita dentro da empresa, é muito importante, de forma antecipada, conversar com os trabalhadores sobre esse tema e prestar o máximo de esclarecimento”.
“Os profissionais de SST envolvidos e a organização discutam e encontrem a melhor abordagem inicial do processo de identificação de perigos e avaliação de riscos dos fatores de risco psicossociais relacionados ao trabalho no estabelecimento”. Pag. 09.
“A organização tem algumas opções para conduzir esse processo nas suas atividades. Pode optar pelo caminho de realizar a observação da atividade de trabalho, incluindo o diálogo com o trabalhador; de utilizar pesquisas padronizadas; realizar oficinas com auxílio de moderação, workshops específicos para determinados setores ou atividades; ou utilizar uma combinação dessas opções. A organização também pode optar em conduzir todo o processo por meio de um time de especialistas, utilizando um processo multidisciplinar”. Pag. 09.
“Em relação às ferramentas de avaliação/questionários/pesquisas, o MTE não define ou não sugere nenhuma metodologia específica. Essa é uma questão que a organização junto com seus profissionais de SST precisa verificar e selecionar”. Pag. 10.
“A ferramenta deve avaliar os fatores de risco de uma forma relacionada com as condições de trabalho existentes na empresa, conforme previsto pela NR-1 e NR-17”. Pag. 10.
“Ao utilizar uma ferramenta específica deve-se verificar se ela está cientificamente fundamentada, ou seja, se existe estudo científico ou um órgão ou instituição de SST, nacional ou internacional, que lhe dê embasamento e suporte. É importante verificar as qualificações, treinamentos e habilidades necessárias para a aplicação dessa ferramenta específica”. Pag. 11.
“A organização vai descrever as características do trabalho nas diferentes atividades, áreas e postos do trabalho, considerando a atividade real que o trabalhador está desenvolvendo. Cabe destacar, não se trata da tarefa prescrita, mas da atividade que está sendo efetivamente realizada, ou seja, o trabalho real. Nesse processo, a organização irá verificar se os fatores de risco psicossociais estão presentes nas atividades de trabalho”. Pag. 11.
“Se os fatores de risco (perigos) estiverem presentes, deve-se prosseguir no processo, realizando a avaliação e a classificação do risco, nos termos da NR-1, e considerando os critérios estabelecidos pela organização”.
“Verificado o nível de risco resultante da avaliação e sua classificação de prioridade, deve-se adotar, aprimorar ou manter medidas de prevenção para diminuir ou controlar o nível de risco que foi apurado. Isso deve ser feito por meio de um plano de ação, documento com os registros que demonstram a implementação das medidas de prevenção e o seu acompanhamento. De acordo com o subitem 1.5.5.2.2 da NR-1 deve ser definido cronograma com responsáveis, formas de acompanhamento e aferição de resultados”. Pag.12.
“Aspecto fundamental do acompanhamento das medidas de prevenção trata da participação dos trabalhadores. Os trabalhadores, que devem participar de todo o processo de identificação do perigo, avaliação do risco e adoção de medida de prevenção, são fundamentais para que essas medidas sejam mantidas ao longo do tempo”. Pag. 13.
“Todas as etapas desse processo devem ser registradas nos documentos do PGR ou da AEP (no caso de empresas dispensadas de elaborar PGR, nos termos da NR-1)”. Pag. 13.
Se você ler com atenção todas essas determinações vai constatar que a NR01 em seu aspecto psicossocial, incentiva gestores, empresários, técnicos e trabalhadores na criação de um estado, ou cultura, organizacional de alta performance. Um fluxo contínuo de melhorias comportamentais capazes de conseguir elevados patamares de produtividade fundamentado na constatação de que só é possível esse estado com trabalhadores saudáveis, biológica e psicossocial.
A meu ver uma grande oportunidade para gestores, de organizações de todas as categorias, revitalizarem seus procedimentos de gestão e operação em buscar de seu crescimento contínuo e perenidade.
Mas… Claro, muitos gestores, trabalhadores, técnicos etc., envolvidos nesse assunto poderão dar de ombros e ver nessa norma apenas, e mais uma, obrigatoriedade e ingerência governamental.
Como a própria norma prescreve, cabe a cada gestor decidir como deseja identificar, tratar e prevenir distúrbios psicossociais e conseguir suas realizações empresariais.
Por fim, fica a sensação de que estamos diante de uma oportunidade para rever e modificar nossas próprias concepções de saúde e performance!
Qualquer sugestão ou contribuição, entre em contato.
Grato,
LAUTER F. FERREIRA
AYRES & FERREIRA LTDA.
Psicólogo – CRP-06/09138-0
Autor dos livros “Construindo Equipes de Alta Performance”,
“Alta Performance: Sete Forças Sob Sua Pele”.
lauterferreira@ayreseferreira.com.br
www.ayreseferreira.com.br